O Leitor


“Penso, chego a um resultado, mantenho o resultado preso a uma decisão e faço a experiência de que a ação é uma coisa por si mesma, que pode mas não tem de seguir a decisão. Com bastante frequência no decorrer da minha vida fiz o que não tinha decidido e deixei de fazer o que tinha decidido”



Autor: Bernhard Schlink
Editora: Record

   Michael Berg, um adolescente alemão, passa mal no caminho da escola para casa, e é ajudado por uma mulher vinte anos mais velha. Doente por meses, quando se cura vai à sua casa agradecê-la, e acaba ficando com sua imagem marcada na cabeça. Começam então a ter um caso escondido, intercalando as relações com leitura de livros clássicos. Depois de um desentendimento, ela desaparece, deixando uma marca de grande culpa nele.

   Anos depois, estudante de Direito, Michael participa de um seminário especial, que estuda o julgamento de guardas da SS em uma tragédia específica, quando em uma noite muitas mulheres judias morreram queimadas em uma igreja, que não foi aberta pelas guardas para que elas saíssem quando começou o fogo. Uma das guardas era Hanna Schmitz, a mulher que ele amara na juventude. 

   Assisti ao filme de mesmo nome à algum tempo, ano passado se não me engano, e lembro que fiquei acordada até mais tarde do que deveria para poder acompanhar o final. Esse ano, olhando a biblioteca comunitária da minha faculdade, encontrei algumas cópias do livro e resolvi dar uma chance de novo à história que me chamou atenção. Não tinha visto o filme desde o começo mas sabia mais ou menos como começava.

    Confesso que não consigo decidir qual dos dois me interessou mais. O livro é muito bem escrito e muito profundo, cheio de reflexões que devem ser feitas quanto ao tema. O filme é muito bem interpretado e fiel ao livro. O tema Holocausto sempre me chamou atenção desde o colégio, talvez por ser tão difícil de ser entendido, se é que alguém pode realmente dizer que o entende. E é difícil ler sobre ele, por tamanha crueldade envolvida.

   Ao mesmo tempo que de certa forma sinto uma rejeição geral ao se falar nisso, sinto que devemos estudar e falar. As coisas hoje em dia tem se tornado de certa forma muito cruéis também. A violência tem se mostrado cada vez maior nos noticiários, e isso me preocupa muito. Temos visto mais casos de assaltos seguidos de bárbaras mortes, estupros, e outras maldades enormes, e me pergunto o porque disso. 

   Da mesma forma que não entendemos o que houve na época, não consigo entender o que acontece hoje em dia. Será que nossos descendentes, no futuro, lerão sobre nossa época e se indignarão e não entenderão o que houve conosco tanto quanto não entendemos o que aconteceu no passado?

   No livro vemos claramente essa questão de culpa, quando Michael se sente mal por amar uma criminosa, por não entender como pôde amá-la, mas ao mesmo tempo não consegue esquecê-la, e com isso vive uma vida perturbada, se fechando para o mundo, não conseguindo viver normalmente. E se questiona sobre o Nazismo do mesmo modo que nós, praticamente 68 anos depois, também fazemos. Sua geração não consegue entender o que houve, e não consegue lidar com isso. 

   Hanna vive um segredo que modifica todas suas escolhas durante sua vida, e de forma alguma justifica o que fez de errado. Quantas vezes fazemos escolhas erradas com medo de fazer as certas ou para não ferir o orgulho? Ao ser colocada de frente às consequências de suas escolhas, Hanna não consegue lidar com elas. 

   O livro faz questionamentos quanto moral, escolhas, ação, pensamento, culpa, questionamentos estes que as pessoas deveriam se fazer antes de agir, e que muitas vezes não o fazem. Um questionamento em particular que o Holocausto e a atualidade nos forçam a fazer é: até que ponto a sociedade e as ordens são significativas frente à escolha pessoal? Realmente somos obrigados a alguma coisa nessa vida, ou nos deixamos ser para termos a ilusão de que não temos escolha e assim não precisarmos encarar as consequências como nossa culpa no futuro?   

"Eu tinha sempre a sensação de que, sem dúvida, ninguém me entendia, de que ninguém sabia quem eu era e o que me levava até aquele ponto da minha vida. E você sabe, quando ninguém entende, ninguém pode exigir que você preste contas. Mas os mortos podem. Eles entendem. Para isso não precisam ter estado por perto; mas se estiveram, entendem especialmente bem."

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